Jennifer Lynch - O Diário Secreto de Laura Palmer [Opinião]

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Opinião: Recordam-se da série Twin Peaks? Passou na RTP1 em 1990, salvo erro. Lembro-me que era muito miúda e ia para a Escola Primária de Miraflores (que já nem existe) e a conversa habitual no autocarro 50 eram as inúmeras teorias sobre o homicídio de Laura Palmer. Mais tarde, era eu adolescente e fascinada por séries com enfoque criminal, consegui ver a primeira temporada. Não sou, confesso, grande fã de David Lynch. Acho que os trabalhos dele são demasiado subjectivos e apela a uma interpretação muito própria do telespectador. Só ao ver o filme spin off Twin Peaks: Fire Walk With Me é que soube a identidade do assassino da rapariga, uma vez que na série esta é desvendada apenas na segunda temporada.

Este filme, ao contrário da série que incidia sobre a comunidade após a morte de Laura, explica os últimos dias da vida da rapariga.

Cheira-me que a febre do Twin Peaks vai voltar. A série regressa para o ano, embora ainda não saiba bem em que moldes (o elenco é praticamente o mesmo e até Sheryl Lee, 26 anos mais velha, vai voltar a encarnar Laura Palmer). 

Posto isto, porque não rever a série de culto e ler esta obra antes de 2017? Até porque a meu ver, faz mais sentido ler este diário sabendo alguma coisa previamente sobre o universo Twin Peaks. Na minha opinião, quem desconhece a série e envereda por esta leitura vai achar que é um mero diário de uma miúda e até o vai achar incompleto uma vez que nem sequer desvenda quem a matou. Além disso, a série apresenta as personagens secundárias, como o núcleo familiar e amizades da protagonista. O diário não contém elementos suficientes para que o leitor avalie devidamente as personagens de cariz secundário. 

Este diário, escrito aquando a transmissão da temporada 1, pretendia dar algumas pistas e, acima de tudo, maturar a ideia de que Laura Palmer não era tão inocente e altruísta quanto os locais de Twin Peaks a pintavam. À primeira vista, a percepção que tinha da série, é que a adolescente era modelo na comunidade pois fazia voluntariado, trabalhava e estudava, tendo um percurso escolar regular. O diário deita esta hipótese por terra.

O diário inicia-se quando Laura tem doze anos e é visível a inocência da menina. A pouco e pouco, a personagem vai partilhando alguns pensamentos mais sombrios e apercebemo-nos de que algo de muito errado está a acontecer com a miúda. Além disso, a personagem partilha pensamentos mais íntimos, tal como a iniciação sexual ou a experiência com drogas. E acaba, por isso, por ser uma obra perturbadora a par das inúmeras referências, ainda que implícitas, a abusos infantis.

Na série, recordo-me de ver o agente de FBI Dale Cooper com algumas visões sobre os acontecimentos. Notei uma tendência semelhante na obra: há uma fronteira pouco definida entre os pensamentos da personagem e a realidade.

Apesar de ser uma situação ficcionada, tal como o próprio Lynch frisou, as páginas arrancadas do diário conferem um aspecto bastante realista à trama.

Em suma, O Diário Secreto de Laura Palmer é um bom complemento à série e convidativo para ver (ou rever) uma das obras mais conhecidas de David Lynch. Um livro que, à medida que folheamos as páginas, nos suga cada vez mais para aquele ambiente psicologicamente pesado.