terça-feira, 27 de agosto de 2019

Lina Bengtsdotter - Annabelle [Opinião]

Sinopse: AQUI

Opinião: Sendo deslumbrada pelos autores oriundos da Escandinávia, foi com muito entusiasmo que recebi a notícia da publicação desta obra. Não conhecia a autora, tanto quanto pude apurar, Annabelle é o pontapé de partida para uma série recente protagonizada pela detective Charlie Lager cuja conduta poderá ser reprovável - se tivermos em conta o seu comportamento de alcoolismo e promiscuidade - ou desculpável caso consideremos os seus esqueletos no armário. O vício do álcool fez-me irremediavelmente lembrar o Harry Hole, protagonista de uma outra série de livros escandinava. 
Surge assim um laço entre leitor e protagonista, não muito comum se tivermos em conta que este é apenas o primeiro livro da série. Contudo sinto que a personagem ainda pode vir a dar cartas e aprecio quando as protagonistas apresentam um potencial que é explorado na medida certa na obra de estreia.

Ainda que a premissa seja sobre uma adolescente, Annabelle, que desaparece após ter ido a uma festa, esta não é uma típica trama policial assente sobre os procedimentos de investigação. Pessoalmente senti-me não só intrigada pela realidade por trás deste desaparecimento - estaria Anabelle raptada ou morta? - como também pela origem de um comportamento tão auto-destrutivo por parte de Charlie. Creio que a trama está muitíssimo bem construída alicerçando-se sobre a acção actual e uma outra, protagonizada por duas meninas cujos nomes, Alice e Rosa, nos são alheios e, por conseguinte, toda esta subtrama aparenta ser desconectada. Esta subnarrativa começa por ser uma inocente história sobre amizade que vai escalando para uma relação de natureza mais sombria, o que me deixou bastante curiosa em saber como esta peça se encaixaria no puzzle.

Agradou-me que o passado de Charlie fosse sendo desconstruído gradualmente através de flashbacks que remotam à sua infância, focando-se concretamente na relação disfuncional que esta tinha com a mãe, Betty. E aqui entra uma certa redenção da personagem, não desresponsabilizando os seus comportamentos, é certo, mas apelando a uma compreensão por parte do leitor.

A caracterização minuciosa das personagens traduz-se num ritmo lento no que concerne à investigação policial propriamente dita. Ainda que seja uma leitora ávida desta componente, como sabeis, este pormenor não me desagradou, creio que aproxima a obra do género de thriller psicológico tendo assentando sobre a investigação policial do desaparecimento. 

Reconheço alguns clichés no comportamento dos adolescentes e no mundo de Annabelle, deitando por terra a minha impressão pessoal que na Escandinávia, a juventude tende a ser menos louca, não me tendo sentido, ainda assim, descontextualizada com esta realidade, percepção que associo à diferença de idades, entre a minha e a dos jovens amigos de Annabelle. 

Ainda que me tenha sentido satisfeita ao longo da leitura, tive um dissabor com o final. A meu ver, este poderia ter sido mais explorado e, consequentemente, teria tido um maior impacto.

Em jeito de conclusão, não poderia expressar o meu desejo em ver publicada a continuação da série, uma vontade que se prende especificamente com a avaliação do progresso da protagonista. 


segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Michelle Adams - Entre As Mentiras [Opinião]


Sinopse: AQUI

Opinião: A recente obra de Michelle Adams, autora do livro Se Conhecessem A Minha Irmã, debruça-se sobre mentiras, como o título assim o sugere. Este é um ingrediente que prezo devido à sensação de insegurança que sinto face ao desenvolvimento da trama por não conseguir destrinçar os factos reais das mentiras.

Apesar de ter considerado a premissa um pouco cliché, alicerçando-se sobre uma situação de amnésia, gostei da forma como a história se desenrola pelo motivo que afirmei anteriormente. Deve ser deveras assustador não nos conseguirmos lembrar absolutamente nada da nossa vida, pelo que esta situação, por si, conseguiu inquietar-me. Contudo, esta condição de amnésia de Chloe, na minha opinião, iliba-a de ser uma narradora não confiável, um papel que, a meu ver, foi desempenhado pela sua família. Fiquei com uma estranha sensação que estes não a queriam realmente ajudar e senti-me genuinamente intrigada com esta percepção.
Estamos perante, portanto, uma trama que explora as dinâmicas familiares, semeando, uma vez mais, a dúvida se conhecemos realmente as pessoas com quem vivemos, um tópico vulgarmente usado no género de thriller psicológico.

Relativamente à personagem Chloe, que considerei uma vítima - aquele acidente que lhe alterou a vida consubstanciou-se como um acontecimento trágico não só pela condição da amnésia como também por outra adversidade que me apanhou desprevenida e que me destroçou. Criei, portanto, uma expectativa que esta situação fosse igualmente mentira, como inúmeras informações que se foram seguindo. Entre Mentiras é, desta forma, um livro que mexeu comigo e creio que será uma percepção transversal às leitoras.

A estrutura da narrativa é interessante na medida em que intercala algumas cartas cujo remetente é a pessoa que testemunhou o acidente e a acção propriamente dita. Confesso que a leitura das cartas pouco consolidou as teorias que ia formulando, ainda que não deixe de ser aterradora a ideia que alguém mal intencionado está muito perto. 

Em suma, uma obra que se caracteriza como um verdadeiro jogo de manipulação, tendo a capacidade de ludibriar o leitor página após página. Ainda que tenha preferido o livro anterior da autora - ainda hoje me recordo da relação tóxica daquelas irmãs - vou manter o nome Michelle Adams debaixo de mira.



9º Aniversário do blogue [Resultado do Passatempo]


Em jeito de celebrar o 9º aniversário e para agradecer o carinho de quem segue este blogue, decidi sortear estes dois livros do autor John Grisham. Agradeço as partilhas e o entusiasmo da vossa parte que, como devem imaginar, é extremamente gratificante.

Após verificação das partilhas, contando com 78 participações válidas e posterior sorteio no random.org, a vencedora é:

32 - Maria Santos

Estava tão entusiasmada que me esqueci completamente de deixar uma pergunta sobre a localidade neste formulário mas entro já em contacto com a vencedora, via e-mail, afim de solicitar a morada e enviar os livros. 

Obrigada, uma vez mais, por estarem desse lado! 

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

David Lagercrantz - A Rapariga Que Viveu Duas Vezes [Divulgação Dom Quixote]


Data de publicação: 22 Agosto 2019

               Título Original: Hon som måste dö
               Preço com IVA: 20,90€ 
               Páginas: 392
               ISBN: 9789722068086

Sinopse: A Rapariga Que Viveu Duas Vezes – SEXTO E ÚLTIMO VOLUME DA SÉRIE MILLENNIUM iniciada por Stieg Larsson – é uma narrativa atual, que combina escândalos políticos e jogos de poder com novas tecnologias, genética, expedições dramáticas ao cume do Evereste, e “fábricas” de trolls que criam e difundem notícias falsas, responsáveis por influenciar resultados de eleições ou denegrir a imagem de proeminentes figuras públicas.
Um final épico, em que não faltam o humor e situações levadas ao extremo por Lisbeth Salander que, como sempre, na defesa dos seus princípios, não olha a meios nem recorre a métodos convencionais.
 

Sobre o autor: David Lagercrantz nasceu na Suécia em 1962. É escritor e jornalista e vive em Estocolmo. Depois de ter estudado Filosofia e Religião, licenciou-se em Jornalismo pela Universidade de Gotemburgo. Trabalhou para o diário Expressen como repórter criminal tendo feito a cobertura dos casos mais mediáticos no final dos anos 80 e início dos anos 90 na Suécia.
Publicou várias biografias de personalidades muito conhecidas dos suecos e, em 2011, aquela que foi o seu maior sucesso – I am Zlatan Ibrahimovic – a história do famoso jogador de futebol, nomeada para vários prémios importantes, traduzida em 30 línguas e com milhares de exemplares vendidos. Fez a sua estreia na ficção com The Fall of Man in Wilmslow, uma história baseada na vida do célebre matemático britânico Alan Turing que teve um enorme sucesso internacional. Nos livros de David Lagercrantz encontra-se frequentemente um padrão: grandes talentos que se recusaram a seguir as convenções. Interessam-lhe não só os que se destacam da multidão, mas também a resistência que a sua criatividade inevitavelmente enfrenta. Talvez por isso tenha aceitado a proposta que lhe foi feita em Dezembro de 2013 para escrever o quarto volume da série Millennium criada por Stieg Larsson (1954-2004). Decerto não conseguiu resistir a Lisbeth Salander, uma das personagens mais criativas e irreverentes da literatura contemporânea. 

Anteriormente publicado


domingo, 18 de agosto de 2019

Mary Kubica - Verdade Escondida [Opinião]

Sinopse: AQUI

Opinião: Por alguma razão que desconheço, Verdade Escondida residia na minha estante, por ler, há três anos. Curiosamente, foi o último livro publicado em Portugal desta autora, pelo que, subconscientemente, tê-lo-ei talvez guardado para recordar as tramas da autoria de Mary Kubica. Após a leitura dos três livros editados por cá, confesso que este título foi o que menos gostei.

Tal como as obras antecessoras, a autora opta pela narrativa sob a perspectiva de duas personagens: Quinn, a colega de quarto de uma jovem desaparecida e Alex, um rapaz que trabalha num café e que fica fascinado quando aparece uma rapariga no seu local de trabalho.
As subnarrativas são intercaladas, permitindo-nos conhecer em simultâneo a evolução de cada uma. Confesso que preferi a subtrama referente a Quinn pois senti-me mais interessada pelos contornos da busca por Esther do que propriamente a relação de Alex com a rapariga misteriosa ainda que, numa fase posterior, o jovem me tivesse despertado maior empatia devido aos seus fantasmas do passado. 

Como já tive oportunidade de referir, creio ser inquestionável que uma trama, narrada sob a perspectiva de duas personagens completamente diferentes sem qualquer relação, consubstancia-se deveras intrigante. Pessoalmente, senti-me em suspense para perceber a possível conexão entre os dois protagonistas. Contudo, em certos momentos, senti-me um pouco aborrecida, percepção que atribuo possivelmente a uma impaciência da minha parte pois senti que a autora se debruçou em demasia sobre a caracterização das personagens. Compreendo que Kubica tenha querido uma aproximação entre o leitor e os protagonistas, porém, a meu ver, grande parte dos factos não eram realmente flagrantes para a acção.

Uma vez que o cerne do mistério reside no desaparecimento de uma rapariga, foi inevitável que, numa fase inicial, estabelecesse uma comparação com o afamado Gone Girl. Felizmente que este ponto era o único em comum, convidando-nos a uma reflexão, novamente, sobre o quão bem conhecemos a pessoa com quem partilhamos a casa. Com excepção deste ponto, a história diverge completamente. De facto, não esperava que o rumo da trama fosse o que a autora propõe, pelo que fui surpreendida. Embora a chave do puzzle estivesse fora das minhas teorias, não fiquei completamente convencida nem me senti deslumbrada como acontece nos demais thrillers.

A minha avaliação de Verdade Escondida deve-se também a um contraponto entre as outras obras da autora. Ainda há dias, a propósito de um filme, lembrei-me do estranho rapto explanado na obra Não Digas Nada. Recordo-me, igualmente, da estranha que aparece com um bebé no lar de um casal, premissa de Vidas Roubadas. Tramas estas que, claramente, me marcaram mais do que o presente título.  

Em suma, apesar deste título ser, na minha modesta opinião, o menos estimulante dos três livros editados em Portugal, Mary Kubica é uma autora a ter em consideração. Autora de thrillers aliciantes, espero revê-la novamente em breve.


quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Dick Haskins - A Embaixadora [Opinião]


Sinopse: Naquele fim de tarde ameno, no início do Verão, Vanda não podia imaginar o perigo que a aguardava ao sair do emprego. Mas a verdade é que um grupo de conspiradores vira nela a sósia perfeita para levar a cabo um arriscado golpe político internacional...
Vanda ver-se-á então num papel que nunca sonhara incarnar, passando longas horas de terror e suspense num estádio superlotado, durante um jogo de futebol.
Até que o espírito de observação de uma criança propiciasse, para o caso, uma inesperada solução

Opinião: Confesso desde já que não sou grande apreciadora de tramas que se alicercem em atentados e conspirações, ingredientes que são explanados na presente obra de Dick Haskins. Contudo, abracei o desafio de ler esta obra que sai claramente da minha zona de conforto.
Esta trama apresenta, assim, contornos bastante diferentes das demais. Não que conheça completamente a bibliografia do autor, apenas li O Sono da Morte e vi alguns episódios da série televisiva realizada pelo autor, Dick Haskins, transmitida nos anos 80. Realço que o autor é conhecido pelas suas tramas pertencentes ao subgénero de giallo, em que o protagonista, o detective homónimo, investiga alguns casos policiais, recorrendo ao poder de dedução e lógica, relembrando um pouco o célebre detective belga Poirot.

Em A Embaixadora, deparei-me com uma história completamente diferente, alicerçada sobre conspiração e intriga política. Senti falta, portanto, do detective Dick Haskins.
Ainda que não seja uma aficionada de histórias do género, reconheço que a obra é interessante. Muitíssimo bem escrita, como o autor nos habituou, é uma história que atenta aos detalhes para convencer o leitor que está prestes a presenciar um golpe político contra o país de Puerto Nuevo, no estádio, em pleno jogo de futebol. A trama tem basicamente a duração da partida, o que tornou o ritmo da acção mais intenso. Considerei, portanto, a trama deveras entusiasmante, ainda que prefira as comuns investigações policiais à eminência de um atentado com vista à execução de um golpe de estado.

É uma obra que está claramente descontextualizada contudo não pude deixar de relembrar saudosos tempos em que eu própria me via desesperada com as cassetes para gravar filmes e outros programas e, em caso negativo, escolher escrupulosamente uma cujo conteúdo pudesse ser gravado por cima. É com esta metodologia que Henrique quer ver um jogo de futebol, embora parecendo-me um pouco contraproducente vê-lo em diferido.

Em suma, embora seja um livro antigo e descontinuado, fazendo com que seja provavelmente difícil de encontrá-lo, creio que carece a nossa atenção. Além de nacional, Dick Haskins é, para mim,  literatura policial de qualidade, ainda que este título seja bastante peculiar. Os amantes do género sentir-se-ão agradados com esta história e, em termos gerais, não há como sentir alguma nostalgia da época.

terça-feira, 13 de agosto de 2019

Passatempo 9º Aniversário da Menina dos Policiais


Partilhei convosco, ainda que timidamente - a ideia de envelhecer assusta-me (se bem que este é um caso bem peculiar de "envelhecimento") - que Agosto é o mês em que este blogue comemora o seu aniversário. Muitos de vós enviaram mensagens, expressaram votos de continuação deste trabalho e incentivaram-me a não desistir. Fiquei de coração cheio e estou-vos imensamente grata! 
A forma de retribuir este carinho é ofertar livros. Escolhi estes, saem da minha biblioteca e é com o maior gosto que os mando para a biblioteca de um de vós. Sou old school, deixo um formulário bem simples para que o preencham até dia 23 às 23h59. Sortearei um vencedor via random, entrarei em contacto com o mesmo via e-mail e enviarei o envelope dia 26. Tudo certo? Espero, claro, que seja do vosso agrado!

Partilhem pelos vossos amigos, participem e boa sorte!


Stephen King - Misery [Opinião]


Sinopse: Paul Sheldon, um escritor famoso de romances cor-de-rosa, acaba de "matar" Misery, a personagem que o celebrizou. Depois de o fazer tem um acidente. Quando acorda, descobre que foi salvo por uma ex-enfermeira, Anne Wilkes, que o leva para sua casa e trata dele. Anne, fanática da heroína de Paul, está furiosa com a morte ficcional de Misery. Sob tortura, obriga Sheldon a escrever um novo livro, um regresso de Misery. Paradoxalmente, este virá a ser o seu melhor livro.

Opinião: Creio que esta é uma obra que dispensa apresentações.
Sou grande fã do filme baseado na obra homónima, protagonizado por Kathy Bates e James Caan mas sentia curiosidade em ler a versão original, assim, aproveitando o desafio Um Ano com Stephen King, quis incluir este título e ainda bem que o fiz.
Apesar de conhecer a história a priori, esperava ficar impressionada com a mesma, sensação que, de facto, me acompanhou constantemente no decorrer da leitura. Sem dúvida que existem alguns pontos mais intensos do que a adaptação cinematográfica e é inevitável rendermo-nos a esta invulgar história alicerçada sobre obsessão por um ídolo.

Uma das consequências de ter visto o filme foi a impossibilidade de dissociar as personagens aos actores que as interpretam. Apesar de ter presente todo o o desenvolvimento da acção entre as duas personagens, como referi, esperava que a narrativa me surpreendesse com elementos desconsiderados no filme. Realmente há factos novos, que me chocaram ou acontecimentos que foram amenizados na adaptação cinematográfica. Um deles é, sem dúvida, a apresentação da história que Paul Sheldon é obrigado a escrever para agradar a Annie. De contornos peculiares - afinal de contas é quase como um livro dentro de outro livro - esta história acabou por ser perturbadora na medida em que Misery regressa à vida de uma forma arrepiante. Confesso que, exceptuando a forma como Misery é ressuscitada, os trechos referentes ao novo livro não me deslumbraram, percepção que atribuo à minha ânsia em saber os novos desenvolvimentos da interacção Paul - Annie.

Para mim, esta história é Annie Wilkes. Durante muitos anos, considerei-a como uma das minhas vilãs preferidas, percepção que se intensificou após a leitura do livro. Para mim, ela tem o rosto e a voz de Kathy Bates e compreendo agora a razão da escolha da actriz para este papel ambicioso e tão fielmente representado a partir da obra. A personagem do livro é, como esperava, mais desenvolvida. A passagem em que Paul encontra os recortes, permitindo-nos construir o passado da personagem está ainda mais sombrio e completo que a adaptação.
O comportamento de Annie é extremamente doentio e perturbador, fazendo com que me sentisse incomodada ao longo da leitura. Embora soubesse que a narrativa era tensa e antecipasse algumas das situações, não esperava sentir-me desta forma, percepção que atribuo à forma peculiar que Stephen King relata os factos.

Este livro recordou-me O Jogo de Gerald pelo teor aparentemente simplista da história, protagonizada por apenas duas personagens e desenvolvida num ambiente claustrofóbico. Apesar das características redutoras, temos tanto em O Jogo de Gerald como em Misery, histórias verdadeiramente brilhantes.  

Esta é uma trama completamente isenta da componente sobrenatural a que King nos habituou nas suas demais obras, sendo, portanto, mais assustadora. Tenho para mim que estes comportamentos mais obsessivos são comuns, constituindo, assim, uma ameaça mais real e, por conseguinte, mais tenebrosa. É chocante testemunhar como um sentimento de admiração pelos ídolos, tão comum e banal, se pode transformar numa obsessão doentia.

Posto isto, considerei Misery como uma das obras imperdíveis do autor. Não dispensem a obra só porque já viram o filme, garanto-vos que serão surpreendidos! Misery vai, definitivamente, para o pódio dos meus preferidos. Adorei!


Especial MOTELx 2019: Rasganço de Raquel Freire


Rasganço, termo que simboliza um dos rituais universitários de Coimbra na altura da graduação, será uma das películas nacionais a ser transmitidas no festival de terror MOTELx deste ano.
Desconheço se este ritual é, de facto, como o que nos é apresentado pois a minha vida académica (fui estudante no Instituto Superior Técnico) foi um pouco aborrecida - às páginas tantas queria lá eu saber das práticas sociais universitárias, à medida que os anos iam passando, eu apenas desejava terminar o curso!

Para mim, a magia deste filme provém do cenário e do ambiente. Embora já tenha terminado o meu curso há alguns anos, e, como tal, já não me identificar com o universo académico em concreto, não me senti de todo descontextualizada.
Talvez por não ter estudado em Coimbra e, consequentemente, não ter usufruído de uma vida académica tão rica, senti-me deslumbrada com o ambiente, as serenatas, as paisagens da cidade e com o vislumbre da fantástica biblioteca joanina da universidade. Decerto que o filme é convidativo a visitar a cidade. 

A história debruça-se sobre um jovem que chega a Coimbra que, não sendo estudante, nem tão pouco pertencendo àquele meio, rapidamente trata de se envolver com várias mulheres ligadas à Universidade até ao dia em que a situação escala e o pânico alastra por entre a comunidade académica.

Estamos, portanto, perante uma história de contornos lineares. Já sabemos à priori quem é o vilão pelo que, a meu ver, a trama carecia de uma reviravolta bombástica, possivelmente relacionada com o motivo pelo qual ele age daquela forma. Creio que este foi parcamente desenvolvido e a história tornar-se-ia mais rica caso estes motivos fossem mais aprofundados. Aliás, para mim, a subtrama principal, directamente alicerçada sobre Miguel, o forasteiro, poderia ser mais explorada. 
Os ataques às universitárias poderiam ser mais frequentes e brutais e a investigação policial poderia ter sido mais intensa. Considerei que o puzzle montado sobre as vítimas foi bastante interessante e, pessoalmente, teria gostado de ver essa componente mais aprofundada.

Mesmo que a história pendesse para o subgénero de giallo, esta nunca perderia o seu encanto devido ao ambiente único onde a trama tem lugar. Contudo compreendo que a) este filme é claramente uma produção com poucos recursos e b) não creio que a realizadora quisesse tecer uma trama policial, por isso, compreendo perfeitamente as escolhas de Raquel Freire.

Na apresentação do festival, o filme foi-me "vendido" como sendo um slasher, o que discordo pois grande parte das cenas mais violentas são bastante implícitas. Na realidade, a cena que foi mostrada na apresentação é a única passível de alguma susceptibilidade pois de facto, tem algum gore.

Com isto dito, criei algumas expectativas que foram defraudadas. Ainda assim reconheço que a produção nacional tem algo de mágico, percepção que atribuo ao universo académico único de Coimbra.